O ano de 2020 começou com notícias preocupantes, mesmo antes da pandemia ocupar todo o espaço informativo. Notícias que se prendem com os níveis de destruição das florestas, da vida selvagem, da poluição dos oceanos do principio do fim da biodiversidade. A mesma espécie Homo Sapiens que perseguiu e erradicou a espécie Neanderthal na Europa Paleolítica de há 40.000 anos, cresceu e multiplicou-se, disseminou-se por todo o planeta, desenvolveu agricultura e comércio, estudou as estrelas, desenvolveu misticismos e magias, observou fenómenos da natureza e acumulou conhecimentos que passou às gerações seguintes. Com o passar do tempo este conhecimento resultou em saber de experiência feito. Quantificar, medir, classificar radicaram em inúmeras áreas e disciplinas do saber. Destacaram-se então alguns destes Homo Sapiens que acabaram por criar as famosas Sociedades de Geografia que estudavam o planeta em detalhe e os museus de História Natural expunham os maravilhosos espécimenes da Natureza de forma devidamente organizada e catalogada.
A Ciência passa a ser Lei. Mas, por esta altura, o conhecimento científico já caminhava lado a lado com um dos seus ramos mais destrutivos da história humana: a indústria. A produção em massa prometia fazer estender o progresso a todas as regiões mais remotas. Levar a modernidade e as maravilhas da tecnologia moderna às sociedades mais primitivas. A Inglaterra e os Estados Unidos tiveram um papel fundamental nesta fase da humanidade. A produção industrial massiva gerou riqueza para alguns e a ganância acabou por ser a base da economia capitalista da era moderna. A exploração dos operários pelos patrões originou uma diferente forma de escravatura, repetindo a história cíclica da exploração do humano pelo humano. Opressão, exploração, desumanização levaram à criação de sindicatos que protegessem os mais fracos e desprotegidos da nova burguesia insensível expansionista, ávida de dinheiro e lucros. As políticas de esquerda conseguiram desacelerar aos poucos este processo degenerativo da perda do valor humano. Atingiram-se políticas sociais minimamente satisfatórias, mas o processo demorou cerca de 250 anos.

E eis que, quando tudo parecia caminhar para melhor, o ano de 2020 veio marcar o princípio do retrocesso social. O ano em que o mundo literalmente parou. A grande máquina da Indústria parou. O Comércio parou. A Economia parou. E uma máquina desta dimensão, quando pára, demora a retomar a sua velocidade anterior. Uma máquina deste tamanho, dificilmente voltará a ganhar a aceleração conquistada ao longo de 250 anos consecutivos. Esta engrenagem funcionou sem parar até ao risco de se autodestruir, como uma máquina fabril que deixa subitamente de funcionar. E então tudo pára. Porque a verdade é que esta máquina do Desenvolvimento já há muito que dava sinais de estar sem rumo, dentro da lógica humana. Este monstro, o modelo capitalista expansionista, que prevê apenas Crescimento, já não cabe neste planeta.
Em 2030, para manter os consumos atuais, seriam precisos dois planetas iguais. O que significa que, até lá, esgotaremos selvaticamente todos os recursos atuais até à última gota de água potável, até à última floresta, até à última espécie animal selvagem. E no processo poluiremos os oceanos com lixo, contaminaremos os solos com agro-químicos e resíduos tóxicos, perseguiremos todas as espécies animais num desespero pela sobrevivência, sem paralelo na nossa história passada. Oito biliões de Homo Sapiens a lutarem por comida e água, depois de terem atingido tecnologia e conhecimentos avançados, um longo processo que levou 40.000 anos a construir. Milhares de gerações necessárias para, basicamente, voltarmos quase ao mesmo ponto de selvajaria. Matar animais para comer, destruir tudo à nossa volta e seguir para outras regiões onde fazemos guerras com outros povos da mesma espécie, simplesmente para nos mantermos vivos. Este é o futuro que nos espera neste final de percurso humano neste planeta. Talvez por se terem finalmente apercebido em que ponto da civilização estamos – o fim da estrada – a maioria dos países mais desenvolvidos estão atualmente a investir tudo na exploração espacial.

Elon Musk faz lançamentos e testes de foguetões numa quantidade e velocidade surpreendentes. O desespero parece grande. A China planificou uma plano expansionista espacial tão ambicioso como nos próximos cinco anos estabelecer bases na Lua, Marte e iniciar já este novembro a exploração de minérios com robots. Até a Arábia Saudita está a planear estabelecer-se o mais rapidamente possível na Lua e em Marte. De repente, a febre da exploração espacial parece ser a última moda, mas também a única solução para o problema da sobrepopulação, e da falta de recursos para manter o modelo económico de “Crescimento Eterno”, num planeta finito, que está esgotado, poluído e a chegar ao fim da sua biodiversidade.
Mas tal como destruiu os Neanderthal, o Homo Sapiens, tão empreendedor quanto destrutivo, tão sensível quanto agressivo, prepara-se agora para eliminar e escravizar de vez todas as espécies animais ainda não extintas. Na China e em muitos outros países asiáticos, e já um pouco por todo o mundo, a última moda desumana da indústria animal são as Quintas de Produção de espécies selvagens, para produção de peles ou de alimento. A artificialização da Natureza funde-se com o seu fim e com a introdução da robótica e até de “novas espécies” biónico-robóticas com incisões de Inteligência Artificial. As florestas ardem para fornecer toneladas de madeira a países compradores. Uma política de terra-queimada, uma tentativa desesperada da indústria mundial não parar a sua produção, sempre crescente.

A paragem de 2020 foi o primeiro grande aviso. Não será o último. Os sinais já são mais que muitos. Mas os detentores da economia estão a tentar lutar por todos os meios para manterem a sua máquina industrial e comercial até à destruição final. Tudo pela ganância. A esperança de fazerem sempre mais e mais dinheiro, fazerem mais e mais lucros. Simultaneamente, estes “donos da economia” estão a tentar hipnotizar a população mundial, manipulando até não conseguirem mais os media ou lançando fake news nas redes sociais e internet, para lançarem a confusão e, com isso, ganharem mais algum tempo. Entretanto, vão despedindo os seus colaboradores como forma de tentarem evitar o inevitável: o fim do modelo económico expansionista do século XX. Segundo alguns sociólogos, o desemprego a partir desta fase vai ser sempre crescente e tornar-se-á na chama que vai incendiar a insurgência social e urbana.
Os cenários apocalípticos estão na ordem do dia neste 2020. Florestas de dimensão planetária a arderem descontroladas. Um vírus altamente contagioso disseminado globalmente que está a mudar radicalmente o modo de vida instalado. Espécies animais perseguidas descontroladamente até à extinção. Contaminação dos oceanos a atingir proporções irreversíveis. E as poucas soluções que vão sendo timidamente implementadas por alguns países, não passam de medidas de emergência para o curto prazo. Mas o tsunami da destruição já está a varrer o planeta de norte a sul, de este a oeste. E o que nos espera não é a salvação. Mas a sobrevivência. E este mesmo Homo Sapiens já demonstrou por diversas vezes, como se pode comportar em situações de sobrevivência extrema. O período de paz e amor, vivido pela maioria dos países, entre os anos 70 e a atualidade chegou ao fim. Começaram as guerras comerciais, os jogos da fome, a luta pela sobrevivência familiar. O princípio do fim da sociedade industrial. A Nova Era começará com privações, depois anarquia social e por fim a diluição de fronteiras. O princípio da guerra global pela sobrevivência. Blade Runner 2049, previsto para daqui a 29 anos, afinal chegou mais cedo.

Texto de Pedro M. Duarte