Facebook Passa da Moderação à Censura Política?

No passado dia 27 de janeiro de 2021, Mark Zuckerberg anunciou uma nova fase do Facebook. A rede social vai reduzir conteúdos políticos, maioritariamente no feed de notícias, sob o pretexto de que está a gerar demasiadas fakenews e discurso de ódio. O CEO igualmente justificou a medida como sendo a vontade expressa de milhares de utilizadores daquela rede social. Mas na realidade o Facebook já é acusado há vários anos de instrumentalizar a sua plataforma digital para manipular eleições, e mais recentemente, para lançar uma política de venda de dados a empresas privadas que inundam os seus seguidores com publicidade e links invasivos das suas escolhas voluntárias. Zuckerberg afirma que discussões em grupos políticos que debatam sobre justiça vai ser permitida, mas que vai deixar de fazer recomendações proativas de grupos ligados a política. As “boas intenções” do CEO já foram questionadas no passado e esta sua decisão parece estar a abrir um precedente perigoso nas redes sociais: o de passar da moderação à censura. Foi assim que, justamente há 100 anos, muitas democracias consideradas livres, começaram a reduzir o grau de liberdade da imprensa, até se transformarem em regimes fechados e controlados pelos Estados. A revista Vanity Fair, por exemplo, questiona a fiabilidade de Zuckerberg para fazer esse tipo de filtragem de forma imparcial.

A gota de água para esta tomada de decisão parece ter sido a invasão do Capitólio em Washington DC, incentivada pelo ex-Presidente Trump. A publicação de vídeos, imagens e comentários que levaram à invasão e ao ódio pelo sistema democrático norte-americano, levou a que milhares de utilizadores do FB apelassem a que algo fosse feito para evitar a proliferação de ódio político que acabou por abalar a imagem dos EUA e do seu sistema democrático centenário. O Facebook decidiu também retirar de vez anúncios de armas, em especial nos EUA, onde ainda eram permitidos. Imediatamente não se fizeram esperar as reações dos apoiantes de Trump, nos quais se incluem inúmeros ex-militares, que defenderam a tentativa de golpe de Estado de Trump e que agora poderão enfrentar-se a tribunais militares, onde as penas para este tipo de crime são mais gravosas. A plataforma digital tem, por outro lado, sido criticada por grupos de direita, que afirmam estar a ser alvo de maior censura relativamente a grupos de esquerda. Mas o facto é que a direita tem inundado todas as redes sociais não apenas com fakenews de todo o tipo, como tem incendiado seguidores e opositores com um discurso agressivo e dirigido, ao estilo do que fizeram os seguidores nazis, antes de Hitler passar a liderar a Alemanha. No ano de 2020, no entanto, o Facebook retirou inúmeros posts de grupos de esquerda de grupos como como Antifa e QAnon. Embora tenha começado 2021 por bloquear o perfil do próprio Presidente dos EUA. O que noutros tempos seria impensável, um serviço digital, uma empresa privada, sobrepor-se ao Poder do Presidente.

Por isso devemos perguntar: como tem Mark Zuckerberg tanto poder?

 

A verdade é que Mark Zuckerberg parece ser incontestavelmente um dos homens globalmente mais poderosos. Os Big Tech lucraram em todas as frentes com o confinamento de 2020, sobretudo o Facebook, que continua a liderar no poder de influência que tem em todo o mundo. Desde o seu polémico lançamento da companhia, que terá sido uma ideia original dos seus companheiros de Harvard, que a rede social enfrentou várias acusações e alimentou diversas polémicas. No início, chegou a dizer-se que Zuckerberg fora abordado pelo FBI para fornecer dados confidenciais de todos os utilizadores, diretamente para as bases de dados da Polícia Federal. O que não é de espantar. Aliás na sigla FB (Facebook) apenas falta o I de “Intelligence” do FBI. Será pura coincidência? Não parece, e logo no início da fundação da empresa, foram publicadas inúmeras notícias que referiam a estrita colaboração da empresa com o FBI. Recentemente, parece até que grandes figuras de influência, como Bill Gates, pretendem utilizar a plataforma para controlar e censurar o que se diz sobre eles próprios. Este tipo de manipulação está a crescer e, pior do que tudo, a começar a ser aceite como normal. A Liberdade de Expressão parece estar com os dias contados, na mesma proporção que a extrema-direita e os regimes não democráticos parecem estar a disseminar-se por todo o mundo. Recentemente, até Macron e Merkel viram como preocupante a exclusão das contas de Donald Trump das redes sociais. E muitos senadores republicanos nos EUA insurgiram-se contra a maioria das redes sociais acusando-as de censura.

Num excelente texto de junho de 2020, o autor José Couto Nogueira, no jornal Sapo24, faz uma análise detalhada sobre esta problemática, ou seja, onde começa o fim da liberdade de expressão e onde começa o abuso da mesma. No início estas plataformas eram lugares digitais para trocas de informação, notícias, links úteis. Mas rapidamente foram aproveitados para negócios ilícitos e discursos de ódio. E os Estados Unidos tiveram de regular, já em 1996, os conteúdos partilhados, através da Lei da Decência das Comunicações (Communications Decency Act), nas redes sociais. Ora, segundo esta lei a comunicação social poderia ser levada a tribunal por a violar, mas o mesmo não acontecia com as redes sociais. As redes sociais ficavam na zona cinzenta, indo ao encontro da opinião de Zuckerberg, de que estas eram apenas veículos neutros, ou seja, sem responsabilidade direta sobre o que dizem ou fazem os seus utilizadores, uma sistema aberto.

Mas hoje sabemos que essa “idade da inocência digital” já passou. E por isso veio, primeiro a moderação, realizada por todo o mundo. E agora a censura, face à intensificação dos discursos de ódio, das fakenews e, mais recentemente, do aproveitamento que ditadores ou presidentes antidemocratas estão a fazer das redes sociais. Certo é que Trump foi a gota de água, no caso do Facebook. Embora, neste ponto, as opiniões se dividam, a maioria dos utilizadores não consideraram o bloqueio de Trump tanto como censura, mas mais como uma necessidade social. Até porque o próprio Trump tentou em junho de 2020 silenciar as redes sociais que se insurgiam contra ele, lançando uma diretiva contra o que o próprio Presidente designou como “censura”. Diretiva que foi imediatamente alvo de ação judicial. Mas agora, passados 6 meses, as redes sociais tiveram a sua vingança.

Será que ainda vamos a tempo de evitar a censura total ?

Mas a pergunta de um milhão de dólares talvez seja: irá o Facebook implodir ?

O excesso de confiança da rede social de Zuckerberg parece estar a voltar-se contra ela própria. Desde as eleições de Trump que começou uma nova onda de adesão a novas plataformas digitais, cuja expansão foi também potenciada pelo confinamento. Mais livres de regras e descontraídas, estas novas opções são, na realidade, uma lufada de ar fresco. Cansados de moderação, de “castigos” e censura, de perfis bloqueados e avisos de conteúdos, os utilizadores mais novos do Facebook já não têm paciência para tantas regras, impedimentos e publicidade preditiva. Mais recentemente a decisão da WhatsApp em obrigar os seus utilizadores a partilharem as suas informações com o Facebook, foi a gota de água para a mudança. Os ataques à WhatsApp e ao FB não se fizeram esperar. Já existem inúmeros apelos online para que os utilizadores FB apaguem a sua App dos smartphones. Os problemas de segurança da rede também têm contribuído para o descontentamento generalizado, até mesmo em Portugal, onde o CEO teve mesmo de processar dois portugueses que desenvolveram uma App que roubava dados da sua plataforma digital. O futuro já não parece estar do lado de Zuckerberg e da sua obcessão monopolista. 2021 poderá ser o princípio do fim desta rede. Até mesmo os seus funcionários já se estão a revoltar contra as próprias políticas de “moderação” da empresa, as quais também apelidam já de “censura“. Os recentes ataques a páginas de direita pode criar uma cisão irreparável no seio da imagem de marca da empresa.

Para já, Zuckerberg não sabe ainda que passo dar no caso da suspensão da conta de Trump. mas adivinha-se uma guerra nos tribunais, para a qual o ex-presidente republicano já está a angariar fundos de milhões. Mas além de Trump muitos outros grupos e empresas prometem guerra ao gigante Facebook. James Cook, homem forte da Apple arrasou esta quinta-feira Zuckerberg e a sua rede social em resposta aos ataques do CEO do FB contra a Apple. James Cook acusa a rede de desinformação, polarização e de influenciar a sociedade através de algoritmos ridículos. E Zuckerberg prepara-se para processar o seu rival, também por concorrência na área das mensagens.

A censura do Facebook parece ter aberto uma ferida social que pode não ter cura. E as guerras entre titãs da Big Tech são um sinal claro do início da decadência desta plataforma digital. Cabe aos utilizadores o julgamento final do CEO e da rede “ainda” mais famosa do mundo.

Texto de Pedro M Duarte

 

Nota adicional: O Project Veritas lançou no dia 31 de janeiro de 2021 um vídeo com várias horas de conversação entre colaboradores do FB e Mark Zuckerberg, onde se debate o excessivo poder da rede na censura política e como exerceu a sua influência nas eleições dos EUA em 2020.

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3 respostas

  1. Em meio ao seu habitual arrazoado, o Pedro desta vez decidiu contar uma anedota, mas das boas. No seu abrangente “espírito crítico”, não só considera o QAnon um movimento de esquerda, mas até o equipara ao Antifa. Eu, que pensei já ter visto de tudo, não pude evitar o maior espanto. Agora já só resta chamar ateu ao Papa. Mas lá virá a altura, pelo andar da carruagem.

  2. Tenho a ideia de que este Sr. Zuckerberg bem como outros extraterrestres das bigtech começaram há muito a fazer xixi fora do penico.
    Vamos ver o que isto dá. Agora qualquer coisa de que se não goste é: incitamento ao ódio.
    Sempre embirrei com americanos, sejam eles republicanos ou democratasmacoes.
    Mas cortar a internet ao Presidente de um país não lembra ao diabo!+

  3. Foi desmomeradoá!
    Incitava ao ódio?
    Não gostaram da referência aos maconicos?
    Para serem tão puritanos podiam dizer a razão ou não.
    São os detentores da razão

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