Populismo é o epíteto pejorativo utilizado para reposicionar a mira do inimigo externo previamente utilizado, o terrorismo islâmico, para o inimigo interno, os partidos anti-sistema emergentes da auto-destruição dos partidos que criaram o estado social. É uma versão actualizada do totalitarismo que condenava, ao mesmo tempo, o nazi-fascismo e o estalinismo-comunismo, dentro e fora do país.
“Nem fascismo nem social-fascismo, independência nacional!” foi uma palavra de ordem anti-imperialista gritada durante a revolução dos cravos, em que se reivindicava a soberania nacional, na senda do movimento dos não-alinhados, entretanto diluído na globalização gizada pela superpotência sobrevivente do fim da Guerra Fria.
A democracia do centrão, dos interesses determinados pelas negociações entre as elites globais e os poderosos locais, revela dificuldade em subsistir quando o povo observa os jogos que os interessados preferem manter discretos e, de preferência, secretos. A transparência, desde os anos 90, tornou-se um problema de primeira grandeza que não para de aumentar de importância. Os demagogos, os do regime e os dos novéis partidos, desde o do general Eanes ao Paulo Portas, focam-se na corrupção, reduzindo-a a um problema de justiça, como se não fosse, à evidência, um problema político. A história encarregou-se de revelar a respectiva eficácia na luta contra a corrupção.
Com a expressão populismo, os partidos da situação pretendem confundir a crítica popular com o oportunismo neo-nazi-fascista, dando a entender perversamente que a escolha entre democracia e ditadura é maniqueísta, é uma questão de carácter entre os políticos moderados do centrão e os radicais, metendo no mesmo saco eleitores e partidos novos.
A perversidade desta crítica é que contribui para entregar à extrema-direita o monopólio da crítica à democracia que há e, juntamente, os votos dos que não suportam mais o desdém anti-popular dos poderosos ao serviço das elites.
A Constituição norte-americana ficou famosa pela expressão com que inaugurou a sua formulação: “We the people.” Este povo, cuja expressão em inglês também quer dizer pessoas, excluía os escravos e outras “minorias”, como as mulheres e os inimigos, como os povos ameríndios; enfim, excluía os humanos que não-são-pessoas-completas. Os Povos da Revolução Francesa, da Revolução Republicana em Portugal, da Revolução dos Cravos, são povos diferentes entre si, mas todos foram protagonistas da história. Viram o seu nome anónimo inscrito nas constituições respectivas como protagonistas. Povos cuja existência é representada pelos eleitos e excluem tacitamente outros povos e partes de si mesmos, como os ciganos, os muçulmanos, os judeus, os negros.
A expressão populismo releva de uma versão elitista e negativa da noção de Povo, a que distingue os maus e imprevisíveis populares das pessoas de bem, nomeadamente os seus representantes moderados. Ao fazê-lo, não está a oferecer uma visão do mundo social diferente da que é usada pela extrema-direita, que também apela à colaboração das pessoas de bem.
A ironia desta situação é que as evidências mostram a pegada política do povo de forma inequívoca: o feriado da revolução comemora o 25 de Abril, o dia do golpe de estado militar que o povo transformou numa revolução. De modo semelhante ao confinamento popular que antecipou a decisão de confinar do governo, aquando do começo da pandemia de COVID-19, também em 1974, antes de a PIDE e de a censura serem extintas, já os presos políticos tinham sido libertados e começava a caça aos Pides e a compra em massa dos jornais, nas ruas.
Os vencedores do 25 de Novembro não se atrevem a transferir o feriado de data, pois temem que o povo que dizem não existir exista mesmo e se zangue com os que exercem o poder em seu nome. O nome que substituiu Salazar na ponte sobre o Tejo continua a ser 25 de Abril. A nenhum beco se deu o nome de 25 de Novembro.
Uma resposta
sou contra qualquer estado com o qual não fiz qualquer contrato social
D.Fernando II também foi esquecido e muitos outros
«oi polvo unido nunca será vencido