As Teorias do Zeitgeist Nunca Estiveram tão Atuais

O Movimento Zeitgeist publicou a 15 de janeiro de 2011 o terceiro dos seus vídeo-documentários, intitulado Zeitgeist: Moving Forward, que revela as suas preocupações sociais numa sociedade orientada essencialmente por uma economia capitalista cujo objetivo não é coletivo, mas tendencialmente individualista, visando apenas o lucro de alguns, enquanto ilude a maioria, a qual utiliza para alimentar a sua lucrativa máquina produtiva. Face à excessiva oferta de bens de consumo por uma economia cujo modelo é o Crescimento Infinito num Planeta Finito, o desemprego começa já a ter um peso muito grande na grande maioria das sociedades. Cada vez mais famílias ficam de fora da falsa roda do dinheiro, um jogo criado para incentivar o consumo e promover a insatisfação compulsiva dos humanos. E na realidade, o ser humano não precisa de dinheiro para viver. Necessita apenas e acima de tudo estar bem organizado em sociedade, utilizar a sua racionalidade para tomar decisões verdadeiramente inteligentes relativamente ao aqui e agora, mais do que apegar-se a um futuro fictício e incerto. A sua missão deve centra-se na procura da harmonia e da felicidade pessoal e dos grupos onde se insere, encontrar o seu lugar no universo, respeitando todas as coisas vivas e não vivas que o rodeiam.

A economia de base industrial do século XIX criou a ideia de que era necessário consumir para ser feliz e para ter melhor qualidade de vida, porque as indústrias necessitavam criar consumidores diretos para os produtos saídos diretamente das grandes fábricas e marcas que estiveram na génese da Revolução Industrial. Mas agora, depois de décadas e séculos de consumismo, a ganância empresarial e industrial está a chegar a um ponto sem retorno. Os economistas finalmente perceberam que o modelo de crescimento económico infinito não é viável num planeta sobrelotado de humanos e finito de recursos. Depois da Grande Depressão de 1929 e das duas Grandes Guerras, estavam criadas as condições ideais para que a sociedade de consumo passasse de uma economia de subsistência a uma economia liberalista de modelo fortemente expansionista. Todo o mundo tinha sofrido com as guerras e era necessário reconstruir muitas sociedades quase da estaca zero. O consumismo entrava numa fase de ouro para os homens por detrás da máquina produtiva. O poder financeiro acabou por dominar a estrutura política e ditar as leis que, inclusivamente, transformaria os outrora cidadãos ativos em meros consumidores passivos.

Criou-se a falsa ideia simplista de que o ser humano deve fracionar o seu conhecimento e especializar-se numa determinada área para que ganhe experiência e dê o seu melhor até ao fim da sua carreira profissional. Mas esta ideia não existe na natureza. Foi criada pelo capitalismo apenas para servir os seus criadores, únicos e verdadeiros usufrutuários. A versão holística e gregária do ser humano e que o tornam uno com o universo está a ser interrompida e violada por um punhado de empresários que o separaram da Natureza e do seu verdadeiro propósito enquanto ser racional e espiritual. Enquanto a ciência ligada à máquina produtiva tenta, por exemplo explicar a biologia humana meramente pela genética, os pensadores holísticos sabem que a maioria das doenças são originadas, não pela biologia, mas por tudo o resto que está ao redor do humano, incluindo todas as condições sociais e outros determinismos que influenciam a sua capacidade de resposta a situações invasivas de stress ou até químicas, relativamente ao seu organismo e ao seu corpo. Esta visão eugénica da justificação genética do comportamento humano é perigosa e pode, num futuro próximo condicionar o direito à vida de muitos humanos. Um princípio aliás já largamente experimentado por muitos judeus que sofreram horrores nos campos de concentração nazis.

A história humana tem sido na sua maioria uma história de guerras, mas com períodos de acalmia que permitiram ao ser humano evoluir positivamente, acumulando experiências traumáticas anteriores num acumular de conhecimentos, por vezes científicos, que o têm feito progredir na corrida de longo curso que representa a evolução do Homo Sapiens. Quando analisamos, por exemplo, os vícios humanos, concluímos que resultam normalmente de estados de ansiedade mal resolvidos, com origem normalmente num determinismo social. O vício permite uma libertação momentânea da pressão, mas facilmente desperta um mecanismo circular na química do nosso cérebro, que leva a que este comande o corpo a repetir a mesma sensação, de forma exponencial.

O vício no trabalho, nos jogos, nas drogas, no consumo são hoje, totalmente explorados pela modelo económico de crescimento, que visa sempre e acima de tudo, o lucro e a acumulação de dinheiro das redes produtivas e de gestão. A criação do falso vício do petróleo em muitos subprodutos da sociedade de consumo foi uma criação original dos produtores desta matéria-prima. E hoje, a humanidade enfrenta-se com o sério problema da sua própria extinção, que foi especialmente acelerado por este “bem de consumo”, que os seus exploradores teimam em defender, mesmo sabendo que está a pôr em causa o destino das vidas de todos neste planeta. A sociedade produtora atual privilegia o vício do lucro em detrimento de todos os outros vícios que origina e que matam milhões de pessoas por ano em todo o mundo. A sociedade, incompreensivelmente, não reage racionalmente perante a evidência da sua própria autodestruição, induzida por apenas 1% da população mundial, ou seja, por aqueles que lucram diretamente da sociedade de consumo.

Desde que o ser humano é um feto, está a receber informação da sua mãe e do mundo que o rodeia. Portanto o momento pré-natal já é determinante e impactante sobre o ser humano, mesmo antes deste entrar em contacto direto com a atmosfera terrestre e o mundo real visível. Depois, no período de infância os primeiros anos são fundamentais para o correto desenvolvimento funcional do corpo e do organismo em geral. É o período mais frágil da vida de um humano. É o momento em que este ativa muitas das suas funções neurológicas e responsivas, que não eram possíveis desenvolver no útero. A aprendizagem da criança influencia também a aprendizagem do adulto e a sua resposta aos mais variados estímulos ocorridos no mundo envolvente. A adaptação nos humanos dá-se na qualidade das relações sociais. É por essa razão que é importante crescer em sociedades onde exista reciprocidade, mutualidade, cooperação, onde a empatia é chave para o estabelecimento de relacionamentos emocionais e cognitivos equilibrados e saudáveis. Muitas vezes na infância por não acontecer o que deveria acontecer e por acontecer o que não deveria acontecer geram-se experiências sensitivas traumáticas que ficam para sempre gravadas na nossa memória emotiva e que poderão influenciar muitos dos nossos êxitos e fracassos futuros.

Noutros casos a ausência ativa dos pais nas vidas das crianças por negligência ou afastamento emocional, podem gerar aquilo que se chama de abandono de proximidade, pais fisicamente presentes mas emocionalmente ausentes. As pessoas mais violentas da sociedade foram na grande maioria, vítimas de abusos ao longo da sua vida, especialmente na infância e adolescência. Crianças que são pervertidas pela violência dos adultos os dos colegas podem resultar em adultos extremamente perigosos e violentos. A unidade contém o todo e o todo a unidade. Este princípio holístico é universal e fundamental para entender o comportamento emocional e social humano, o qual é a base da construção de todas as sociedades, contemporâneas ou futuras. Neste processo entram também as relações interpessoais (pais, familiares, amigos, nossa cultura), fundamentais no desenvolvimento bio-psico-social recentemente designado de neuro-biologia interpessoal.

Geralmente as sociedades dividem-se em dois tipos essenciais: individualistas ou coletivistas. Estes dois modelos são quase antagónicos e geram mentalidades e formas de estar completamente diferentes, também determinadas pela cultura local, regional ou nacional. As sociedades mais individualistas são normalmente fomentadas por um maior capitalismo, gerando uma maior ascensão social, maior estratificação e por consequência também maior desigualdade e menos relacionamentos recíprocos e simétricos. Este tipo de sociedades valorizam as hierarquias em detrimento das relações interpessoais e humanas e o egoísmo em substituição ao altruísmo, mais inato em comportamentos gregários. Num universo mais humano, os seres humanos procuram reciprocidade nos seus relacionamentos emocionais e sexuais, mais naturais do ponto de vista das necessidades naturais da nossa espécie. O companheirismo e o amor são mecanismos geradores de aceitação e equilíbrio. Nesse universo somos aceites por quem somos realmente, as nossas necessidades são atendidas e dá-se uma evolução para pessoas compassivas, cooperantes e empáticas para com os outros. É por isso que hoje sabemos que as sociedades individualistas contrariam a verdadeira natureza humana. As condições que estamos a criar no mundo moderno não favorecem a nossa saúde física e mental nem a nossa missão positiva social. O desequilíbrio do nosso bem-estar pessoal e social pode gerar sociedades disruptivas, sem valores, anárquicas.

No livro “Nature ans Causes of the Wealth of Nations” do inglês do Iluminismo Adam Smith admite-se que os pobres devem servir os ricos nem que para isso se tenham de eliminar os seus filhos ou controlar a sua reprodução, caso exista escassez dos meios de subsistência. Antes mesmo das teorias evolucionistas de Darwin, este filósofo aceitava como normal a existência de escravos cuja função era exclusivamente servirem os seus amos e senhores. Quando pensamos no sistema capitalista de livre mercado implementado por muitos destes filósofos-economistas do século XVIII e XIX, pensamos em bens essenciais ou de consumo. Nunca Adam Smith imaginou, no entanto, que os setores mais rentáveis da economia no futuro seriam precisamente o mercado financeiro, hoje designados como investimentos ou “ativos”. A simples movimentação de dinheiro gera dinheiro num jogo arbitrário sem qualquer mérito para a sociedade. O dinheiro tornou-se numa mercadoria, numa das mais valiosas. A dívida dos países e dos indivíduos é de tal forma valiosa que um banco norte-americano utilizou-se da sua sucursal de Londres para lançar a Europa na ruína ao inundar o mercado de capitais com ativos tóxicos sem valor, originando a Grande Recessão de 2008 impulsionada também pela falência do banco Lehman Brothers, fundado em 1850.

Outro indicador de que a sociedade está a seguir um caminho errado é o índice de crescimento dos serviços de saúde. Quanto mais serviços e medicamentos prestados nesta área maior é o PIB e mais empregos são gerados nos países. Mas o que representa na realidade é se está a privilegiar a doença em detrimento da saúde para que os Estados possam lucrar com isso. Um princípio económico perverso e antissocial. Pela lógica do mercado, quantas mais pessoas doentes, melhor a economia. Por estas razões o PIB é hoje essencialmente um indicador da ineficácia industrial e degradação social. Quanto mais ele cresce, pior é a integridade pessoal dos cidadãos, da sociedade em geral e ambiental. Pela lógica do mercado é preciso criar problemas para fazer aumentar os lucros. No paradigma atual não há lucro a salvar vidas, a manter o equilíbrio do planeta, a saúde efetiva das pessoas, a paz, a justiça. Segundo um ditado norte-americano antigo, “faça aprovar uma lei e abra um negócio”. Hoje em dia só nos EUA existem mais de 2 milhões de presos e a maioria das prisões são verdadeiros negócios entregues a privados e financiados pelo Estado, empresas que negoceiam ações na bolsa em função do seu valor e da quantidade de presos que gerem. E esta lógica é doentia, perversa e perigosa.

O atual modelo económico, para ter sucesso, exige que o crescimento não pare ou mesmo desacelere. Para girar tem de haver consumo, mais propriamente consumo cíclico. E na roda da economia existem três intervenientes-chave: o empregado, o empregador e o consumidor. O primeiro oferece mão-de-obra a troco de um salário. O empregador vende os seus produtos e serviços ao consumidor e por sua vez o consumidor alimenta o sistema para garantir a continuidade da sua existência. Para isso o consumidor tem de trabalhar para um empregador. Assim sendo, o mercado global baseia-se na premissa de que haverá sempre procura e produtos suficientes para movimentar o dinheiro dos lucros a uma taxa que possa manter o processo de consumo. E quanto maior a taxa de consumo, maior o crescimento económico. O atual sistema económico baseia-se em princípios tão perversos como a obsolescência intrínseca e programada, o consumo induzido, o desperdício, a ineficiência funcional. Para manter o consumismo cíclico é necessário que o tempo de vida dos produtos seja reduzido ao mínimo possível tolerado ou que se acelere os fenómenos da moda que criam ciclos rápidos de mudança na maioria dos produtos e tecnologias. O que gerará maiores vendas e maiores lucros aos produtores.

E este modelo está a acelerar exponencialmente o uso de matérias-primas e consequentemente a destruição de todos os biossistemas, dos quais dependemos diretamente, cada vez mais. Modelo que também já se está a estender às empresas de prestação de serviços. Ineficiência, insustentabilidade e destruição são ferramentas utilizadas pelo atual sistema expansionista económico para manter a roda económica a girar. Mas para esta roda continuar a girar, o planeta está prestes a perder todos os seus recursos naturais. E a maioria dos políticos não parecem muito preocupados, porque são diretamente patrocinados pela indústria produtora. E neste processo perverso, os mais pobres serão os primeiros a cair. Mas depois das bases da pirâmide social ruírem, todo o sistema cai em derrocada acelerada. O fim da sociedade humana. Fim por esgotamento do planeta. Fim porque as pessoas continuam a acreditar que tudo se resolverá por si só. Mas, infelizmente, está a chegar o momento em que a sociedade vai despertar. Tarde demais. Mas ao menos assistirá consciente, à sua própria destruição.

 

Texto de Pedro M. Duarte

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