Foi com surpresa que em Portugal se soube de um luto oficial de três dias pela morte da Rainha dos ingleses decretado pelo estado português. O que pode ter motivado tal empatia entre o estado português, republicano, e o estado britânico, uma monarquia que acabou de sair da União Europeia? Talvez a mais velha aliança diplomática do mundo, assinada em 1373.
Imaginando-se potências marítimas, no século XIV, as elites dos dois países tentaram ajudar-se mutuamente a adquirir posições no continente, sem sucesso. Porventura terá sido esse fracasso que transferiu essas ambições medievais para a construção do moderno império ocidental, iniciado no século XV pela Ínclita Geração.
O século XV começou com a conquista de Ceuta e o reconhecimento de que para além do cabo Bojador, a sul das Canárias, o oceano simplesmente continuava: não havia Adamastor. Foram ambas as acções ordenadas por D. Henrique, o membro mais conhecido da Ínclita Geração gerada directamente em resultado dessa aliança, corporizada por D. João Mestre de Avis e a sua Rainha inglesa, Filipa de Lencastre.
A Inglaterra, portanto, nunca esteve muito longe da construção do império, que veio a liderar no século XIX, império em que o Sol nunca se punha.
O império, católico ou anglicano, foi construído sobre a missão auto-atribuída pelas elites ocidentais: expandir a Fé e o Império cristãos, eurocêntricos. A fé nos valores ocidentais foi reforçada pela superioridade provada pelos seus sucessos, reveladora, portanto, da inferioridade dos outros, os fracassados – incluindo a dos portugueses que, entretanto, com D. Sebastião, deixaram de ter papel dominante e, mais recentemente, se vocacionaram em hospitaleiros cuidadores de turistas e reformados.
A Fé vai-se adaptando às circunstâncias. O que se mantém firme é o império, isto é, o saque sobre a inferioridade dos expropriados e em dívidas impostas aos mesmos pelos poderes dominantes, auto-proclamados legítimos.
Com o embalo dos sucessivos sucessos imperiais e a competição entre diferentes elites, que puseram a Inglaterra e os EUA sucessivamente no centro do Império nos últimos 200 anos, procedeu-se a sucessivos revisionismos da história. A escravatura, a Inquisição, o colonialismo, o capitalismo, para estes sucessivos revisionismos nunca existiram. Perante as evidências do racismo, da censura e da tortura, do extrativismo, da exploração dos recursos humanos, têm bastado palavras para negar as evidências: o projecto imperial continua a ser brutal há mais de meio-milénio. Direitos de cidadania e liberdade de expressão, direitos humanos e prevenção da tortura, certificações de qualidade das organizações e empreendedorismo social, meritocracia e currículos vitae, etc., são algumas das formas construtivas de encobrir as realidades intoleráveis promovidas imperial e impunemente.
É sempre com surpreendente surpresa que nos damos conta de viver em sociedades racistas, censórias, em que os poderosos abusam dos seus poderes para fins privados, em que os estados libertados do colonialismo continuam a funcionar como se estivessem colonizados e o capitalismo continua a explorar a Terra. O revisionismo da história tem efeitos práticos nas consciências, turvando-as, justificando a perversidade do salve-se quem poder num mundo estranho e hostil aos cidadãos, na economia, nas finanças, nas doenças, nas guerras.
O decreto de luto nacional em Portugal por respeito a uma rainha estrangeira só é surpreendente quem esteja alienado pelo revisionismo histórico. Esse revisionismo que não ilude as elites portuguesas. Elas sabem que podem continuar a partilhar o império que faz delas elites, a par e em conivência com as outras elites, de que as monarquias – espanhola e inglesa em especial – são símbolos centrais.
As elites portuguesas não falharam em prestar honras à soberana imperial. Também não falharam quando não explicaram as razões de tal homenagem. Marcelo, o explicador, tantas vezes acusado de falar demais, neste caso, esqueceu-se de explicar o que esteve em causa. Também não explicou com o detalhe e exuberância que costuma fazer a outros respeitos, como o futebol, o que esteve em causa com a viagem do coração embalsamado do primeiro Imperador do Brasil, Pedro I, para mais próximo dos outros restos do seu corpo, em S. Paulo. Falar do império, falar como império, promover o império, costumam dizer os representantes das elites, tão exaltados quando viram pichagens anti-racistas escritas em monumentos, é respeitar a história. E é tudo.
Bolsonaro ou Lula, a Rainha de Inglaterra ou o Rei Carlos III, o primeiro imperador do Brasil ou D. Pedro IV de Portugal, são representantes diversos do mesmo Império de os portugueses sentem saudades – o singular sentimento nacional.
Foi a saudade que a diplomacia portuguesa usou na conferência de Berlim, em 1884-5, para conseguir, em concorrência com países muito mais poderosos, direito a uma boa parcela do território então a leilão. Então, como hoje, a contribuição primordial das elites portuguesas para a realização do Império continua a ser reverenciada pelas elites do mundo, na China e em Londres, na condição de a diplomacia portuguesa não se esquecer de aproveitar todas as ocasiões prestar vassalagem aos seus superiores.
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O Império é aquilo que se intrometeu nas nossas contradições, elevando à glória algumas pessoas, heróis, santos, filósofos, reis, sacerdotes, em nome do Pai, i.e., em nome do amor incondicional que os filhos dependentes dedicam aos seus cuidadores. Beneficiam disso as escolas, as organizações que nos empregam, quem nos proteja da força bruta que nos possa ser hostil, numa palavra, o Império, apesar dos males que nos faz.
Nós odiamos o Império que nos consome as carnes nas escolas, no trabalho, nos impostos, e que se intromete nas nossas alianças mais íntimas, nas nossas desgraças mais profundas, nos hospitais, nas morgues. Sim, nós adoramos o império que nos forma como profissionais, que valoriza o patriarcalismo, que nos encaminha para servirmos a nossa comunidade e nos distingue dos que não são da nossa raça, sobretudo os de raças inferiores.
O Império aprendeu a sequestra-nos na nossa ignorância, na expropriação da nossa liberdade de trabalhar naquilo que quisermos, nas nossas identidades nacionalmente concentradas. Paulatinamente, milenarmente, o Império, sucessivamente derrotado e renascendo das cinzas, foi capaz de sequestrar quase todo o mundo, com a globalização. Faz da maioria de nós recursos humanos ao serviço da exploração da Terra, dos outros seres humanos e de nós próprios.
Perante o luto nacional português de três dias pela morte da Rainha de Inglaterra, os portugueses perceberam que não era, como a respeito do Eusébio ou da Amália, a expressão de um sentimento popular. Mas não se incomodaram em saber exactamente o que terá motivado tal decisão. Sabem que não iam gostar de ouvir a verdade. E que contra ela nada estão dispostos a fazer. Por enquanto.
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Tudo aquilo que possa ser destruído pela verdade, deve sê-lo e o mais rapidamente possível (Caitlin Johnstone)
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