É um dia como outros. Faço a higiene diária e sento-me para ler as mensagens e emails da véspera. Amigos que se opõem às políticas globais de gestão da pandemia insistem em manter-me informado, o que agradeço e faço seguir para outros amigos. Hoje dizem-me que se prepara a aprovação de leis para evitar a suspensão das constituições em casos de emergência declarados pelos estados.
“O El País acaba de publicar uma proposta de nova lei da segurança que obriga os cidadãos a desistir dos seus direitos em caso de futuras crises, não estando previstos quaisquer limites: “Em caso de crise declarada em Espanha, as autoridades podem requisitar todo e qualquer tipo de propriedade e a suspensão de toda a espécie de actividades”…
O dever estende-se a cidadãos, empresas e instituições. Os media têm de colaborar com as autoridades na disseminação da informação com natureza preventiva.
A proposta foi apresentada no C. Ministros de 22-6 e é muito provável que venha a ser aprovada e depois eventualmente seguida por outros estados.
É neste contexto de brutal reforço de poderes estatais que o Ministro Francês da saúde, Castex, planeia a vacinação obrigatória.
O cerco fecha-se rapidamente.

Em situações de crise declarada oficialmente, propõe a nova lei, aquilo que agora se faz sem respaldo legal, como colocar toda a comunicação social ao serviço da propaganda global que aproveita o prestígio da ciência e das vacinas para censurar e estigmatizar o contraditório, ou proibir a circulação de pessoas, passa a ser legítimo. Não só ninguém poderá processar o estado por isso como as polícias podem deixar de ser tão condescendentes, como têm sido. Todas as empresas e outras organizações também passam a estar obrigadas a obedecer a ordens de fecho ou de mobilização ou de comportamento, como aconteceu espontaneamente com a COVID-19.
Quem promove estas leis temerá que as pessoas e as empresas deixem de estar sujeitas à coerção social que as faz hoje obedecer voluntariamente às sugestões ilegítimas dos governos. Pode haver um dia em que notícias sobre o sucesso de processos judiciais contra os estados possam por a nu a irracionalidade legal e política do que se está a passar.
É essa a esperança mencionada por um velho médico do mundo. Citando um especialista que era presidente do conselho consultivo do estado Português para a saúde pública e que foi censurado logo no dia em que o primeiro ministro anunciou estarmos em crise COVID e ir seguir as indicações da ciência, Fernando Nobre disse que, do ponto de vista epidemiológico o caso é equiparável a uma gripe sazonal eventualmente mais grave do que o habitual, como já ocorreu no passado sem a declaração ilegal de emergência, nem o recurso ao medo. Está formalizada, diz a notícia do El País, que há quem entenda dever formalizar o dever de obediência para uso futuro.
Garcia Pereira, político e jurista, grita pela liberdade ao modo que se gritou no tempo do fascismo.
Outros amigos dão-me nota de só agora terem lido João Camargo a apelar à desobediência, dada a emergência climática estar soterrada e transformada em indústria verde no período da COVID. O blogger Grazia Tanta reúne sinais variados da deriva fascizante em curso. Ramiro Araújo, médico aposentado, escreve no Twitter:
“Ajudem-me a divulgar que desde março de 2020 se sabe que existem pelo menos 3 MEDICAMENTOS ANTIVÍRICOS que tinham sido antigripais, mantiveram impressionante eficácia contra as doenças por outros CoVs em seres humanos FORAM OCULTADOS pelos lobbies OMS/detentores do poder político”.
Depois desabafa:
“São terríveis a subserviência/cumplicidade/venalidade da comunicação social e o tipo de CENSURA! É mais difícil divulgar verdades científicas em defesa da humanidade do que eram protestos contra a repressão da PIDE antes de 25/4/1974. Fui ativista da CRISE ACADÉMICA COIMBRA 1969!”
Como noutro dia qualquer, faço seguir as mensagens para outros e vou à minha vida, feita que está a higiene. Como qualquer profissional, vou obedecer às ordens de quem me paga o salário e esperar que o estado continue a obrigar aqueles que estão encarregues de trabalhos indispensáveis à minha vida, como fornecer transportes e alimentos, a cumprir as ordens que lhes são dadas, como a mim.
Eventualmente, num dia excepcional, encontrei ao vivo velhos amigos que deixaram de acreditar na bondade dos estados faz tanto tempo que nem sequer se dão ao trabalho de receber e fazer seguir informação que escapa à censura oficiosa.
“Tens a certeza de que isto não é uma epidemia? A vacina não é a nossa única possibilidade de nos livrarmos disto? Desde quando sabes de medicina? Não és sociólogo? Estás do lado do Trump ou do Bolsonaro?”
Não é que acreditem nos noticiários: eles nem os lêem ou vêem. Limitam-se a seguir as práticas sociais de quem está à volta, pois entre a profissão e a acção solidária voluntária não resta nem tempo nem disposição para entrar em discussões nas redes sociais.
Deixei de ser activista há cinco anos. Pensei que o empenho na causa que abracei me impedia de perceber aquilo que reproduzia os males a que me opunha.
O envolvimento de pessoa com uma causa suscita dois tipos de reacção: a) dar o corpo ao manifesto; b) integrar um corpo mais vasto que nos proteja dos riscos e nos torne mais eficazes nas lutas em que nos envolvemos.
Na gíria política, chama-se activista à primeira reacção e política à segunda. A vantagem da primeira é que não é preciso compromissos: não é preciso transigir e enviar para as calendas a solução do problema que é a nossa causa, como a fome, a pobreza, a tortura, etc. Não é preciso comparar o que se passa onde estamos com outras partes do mundo e dizer que somos os melhores enésimos do mundo ou os piores enésimos do mundo. Como activistas podemos simplesmente dizer que “não é possível!”
É muito raro encontrar activistas puros. Qualquer aproximação à política é favorecida por acesso a protecção pessoal e recursos financeiros. “És contra a violência policial nos bairros populares?” podem perguntar aos activistas. “Porque não te dedicas a ensinar os jovens a não estarem nas ruas e estarem em ateliers a estudar ou a jogar computadores? Ainda podias fazer disso profissão.”
“És contra as doenças contagiosas?” dizem as mesmas vozes que não precisa de falar para serem ouvidas dentro das nossas cabeças de activistas. “Porque não te metes em casa e te isolas, pois tens redes de computadores que te informam de tudo o que se passa, incluindo as informações que circulam nas redes sociais e na comunicação social? Dedica-te a entender o que são e não são teorias da conspiração.”
Querer ser activista é tratado como uma doença. É-se canalizado para um serviço que conduz à impotência e resignação profissional. “Estás desesperado, com medo da morte, de ir aos hospitais, da doença mental? Há uma solução: não ligues a nada do que te dizem. Como dizem alguns dos melhores politólogos, a democracia funciona tão bem que dispensa a participação dos eleitores”.
Na verdade há outras soluções. Por exemplo, assegurar a liberdade de todos e cada um da fome e da miséria através de uma determinação nova, anti meritocrática, que pode começar por ser discutida em torno da institucionalização de um rendimento básico incondicional fora do âmbito da intervenção do estado. A experiência mostra como mesmo alguns dos beneficiários líquidos de uma tal medida ou de opõem a ela ou esperam que alguém decida por eles se se deve adoptar ou não. Os activistas reunidos em torno desta medida política animaram-se com a sua popularidade – na sequência da crise de 2008 – e quedaram-se sem luta nem animo.
Não é apenas a respeito da COVID que as sociedades e os activistas modernos aguardam por decisões superiores para lhes obedecer. Afinal a prolongada destruição do meio ambiente que foi favorável à evolução da espécie humana nos últimos 12 mil anos realizou-se concentrando a atenção das pessoas nos jogos de poder, abandonando paulatinamente as suas responsabilidades de cuidar mutuamente umas das outras e de educar as novas gerações. As funções de cuidar e promover identidades sociais passaram a ser monopólios de serviços públicos, como restauração, saúde, educação.
É mais um dia como os outros, em que a herança moderna de exploração da Terra e dos seus recursos, incluindo os recursos humanos, se impõem mais uma vez, protagonizada pelos profissionais e antigos profissionais educados nas escolas e assustados com a eventualidade da abolição dos serviços de saúde pública. Nas escolas e nos serviços públicos também se aprende a pensar racional e cientificamente. Manifestamente, a maioria aprende a seguir ordens e a fazer a sua vidinha, mesmo quando sentem necessidade de ser activistas ou políticos e dedicar as suas vidas a cuidar dos outros.
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