Quando em 1992 o cientista Tim Berners-Lee criou a World Wide Web, concretizava todo um mundo de ficção digital imaginado já desde os anos 60. Para aqueles que tiveram a “sorte”, como eu, de viver no mundo antes e depois deste nascimento que marcaria para sempre a história da sociedade humana pós-moderna, torna-se fácil perceber as vantagens e prejuízos desta revolução tecnológica digital. No início a internet era um serviço caro em Portugal, não só pelos equipamentos que exigia, mas porque ainda não estávamos bem conectados como nos Estados Unidos ou noutros países. A sua utilidade era ainda reduzida. Mas com o aparecimento dos telemóveis e o desenvolvimento e miniaturização digital subsequente, a WWW veio-se a tornar indispensável ao mundo empresarial e até pessoal. E com ela, nasceram as redes sociais. Plataformas de convívio que ligavam pessoas em qualquer parte do mundo, mediante alguns serviços básicos que permitiam publicar fotografias, textos, e mais tarde links e toda uma rede de aplicações associadas. Mas nos últimos anos, as redes sociais transformaram-se num “monstro” gigante, descontrolado, um veículo de transmissão de ódio e corrupção. Nos últimos anos, utilizada até pelas redes terroristas internacionais para difundir vídeos atemorizadores, psicologicamente perturbadores. Juntaram-se também os vírus complexos e hackers que aumentam a utilização criminal destas redes. A pornografia, tráfico de drogas, vendas ilegais de armamento e de todo o tipo de vendas lucrativas do mundo do crime (tráfico de órgãos, de humanos, de bebés, crianças, de animais protegidos,…) num mix de violência, crime e sadomasoquismo, por vezes.
Como sempre, o lado negro do universo, escondido na sombra, tenta dominar o lado bom da vida, a luz, o bem em geral. E este lado negro está a apoderar-se desta tecnologia que pretendia ser útil à sociedade. Apareceram então, depois de lançadas as leis de regulação da internet, os serviços de moderação de conteúdos, cujo desafio é monitorizar, apagar e controlar denúncias ou conteúdos que simplesmente não devem estar acessíveis, por instrumentalizarem os utilizadores a cometerem crimes, inclusivamente o suicídio, de que são exemplo certos “desafios” perigosos lançados por máfias para corromperem os mais jovens.
Mas as redes sociais têm tido também um lado muito positivo, nos últimos anos: sensibilizar o mundo para problemas sociais graves, calamidades ou crimes graves de corrupção. O Wikileaks e outras plataformas de “leaks” têm permitido ao mundo observar como a hipocrisia dos mundos económicos, financeiros, políticos e das máfias se organizam em teias de interesses para servir os propósitos de países, famílias ou empresas tidas como “sérias”. A primavera árabe, eleições, revoluções sociais por todo o mundo espalham-se cada vez mais rápido pelas redes sociais e pela internet. A dromologia do acesso à informação digital e da sua difusão é uma vantagem para a justiça social e para a divulgação da verdade.
Mas será que esta potencialidade interessa a todos?
Efetivamente não. As famílias poderosas, as máfias da lavagem do dinheiro, os traficantes, os políticos totalitários estão a unir-se para acabar ou limitar bastante o acesso a este “bem” digital gratuito ou de baixo custo. Enquanto, por um lado, Trump ameaça ainda no seu mandato acabar com as redes sociais devido ao conflito que teve esta semana com o Twitter, que assinalou um dos seus posts como “apologista da violência”, o Facebook em França vai fornecer à polícia todos os IP’s dos seus usuários que se têm expressado nesta rede social com todo o tipo de discursos de ódio. As redes sociais vão deixar de ser livres, numa primeira fase, e os seus dias podem mesmo estar no fim. Provavelmente, a curto-prazo, vai ser necessário pagar o serviço, para criar uma redução de utilizadores, redução que será discriminatória. Os mais pobres poderão ser excluídos maioritariamente das redes. E numa segunda fase, se esta “metodologia” não resultar e se as elites se continuarem a sentir ameaçadas, as redes sociais poderão mesmo ser banidas da internet.
Controlada por algumas empresas apenas, a internet está a ser manipulada a favor das corporações e grandes grupos económicos. E porque os seus objetivos iniciais estão a começar a ser subvertidos contra os próprios utilizadores, como em regimes totalitários, as redes sociais parecem estar a prestes a implodir. Segundo alguns influencers e vloggers, como Nas, o discurso de ódio está a matar a internet. Num video recente este vlogger expõe a sua perspetiva, dando vários exemplos de utilizadores cuja distração nas redes sociais é espalharem comentários de ódio gratuito, que nalguns casos levam ao suicídio ou depressão.
O que nos diz a experiência é que se as pessoas de rendimentos mais baixos vão ser brevemente excluídas do mundo digital, uma revolução pode estar no horizonte. Uma que talvez se junte às recentes manifestações de anti-racismo, anti-Bolsonaro e anti-injustiças sociais. Depois de 2020 e da pandemia, nada será como antes.

Texto de Pedro M. Duarte
Uma resposta
Apenas censura, apenas isso, a livre expressão da palavra que antes era controlada começa agora a ser silenciada até ser proibida.