O racismo institucional raramente é oficialmente reconhecido. Em Portugal ou noutra parte do mundo. Mesmo os políticos racistas podem facilmente ser encontrados em manifestações a reclamar para que acabem com o uso da expressão racismo: “Portugal não é racista!”
Racistas são os outros. Racistas são os outros países e os naturais de outros países. Isto é, se por acaso há políticas racistas em Portugal é porque outros nos obrigam a protegermo-nos do racismo alienígena. Melhor dito, se não viessem para Portugal de fora, trazendo o racismo contra a nossa vontade e os nossos hábitos, não haveria racismo em Portugal.
Esta teoria neo-nazi-fascista não é original. Ela é prática corrente nas instituições judiciais. Por exemplo, o ministro Sérgio Moro passou por Lisboa duas vezes, a convite da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa como referência da luta contra a corrupção. Nessa qualidade, tratou por criminoso o ex-primeiro-ministro português acusado e não julgado por suspeitas de corrupção, como modo de se furtar à troca de argumentos que poderia caracterizar o espaço público e os processos judiciais.
Claro que há juristas mais sofisticados. Mas, a justiça criminal serve para criminalizar arguidos, em função de uma lista de tipos de comportamento previamente identificados como sendo proibidos (criminalizados). De país para país, e de época para época, as listas de crimes são actualizadas com acrescentos. Um recente é a criminalização de desvio de vacinas. Alguns dos crimes tipificados não são perseguidos, como acontece em geral com os crimes de colarinho branco. Outros crimes tornam-se muito frequentes – como o de tráfico de drogas – sobretudo porque se inverte o ónus da prova para industrializar as condenações de quem não pode nem sabe defender-se.
Resumindo: o juiz Moro está tão habituado a julgar os seus casos olhando para a cara do arguido que lhe calhou ou conseguiu que lhe calhasse – digamos, um sindicalista operário que ganhou protagonismo político suficiente para imaginar que o sistema judicial brasileiro poderia combater a corrupção, se tivesse meios legais para tal – como ministro usou a mesma estratégia: em vez de condenar actos de corrupção, prefere condenar uma pessoa antes mesmo de ser judicialmente provada a sua culpa. Do outro lado do Atlântico, usou a política das pessoas de bem contra as pessoas de mal. A mesma que política anunciada e denunciada na campanha eleitoral para Presidente da República em Portugal, recentemente.
Os professores de direito lisboetas entenderam terem alguma coisa a aprender com este ilustre magistrado, na altura membro do governo brasileiro. Não consta que nem a ideologia nem as práticas jurídicas de Moro tenham sido repudiadas. Foram contestadas por opiniões diferentes, outras escolas. O que ficou dessa visita, foi a legitimidade (ainda que discutível) dos juristas e os governantes de decidirem criminalmente em função da cor de quem estão a condenar. A cor no sentido da cor da pele ou da cor política.
Em todos os países ocidentais, há uma sobre-condenação das pessoas de pele negra ou mais escura, como os ciganos ou sul-americanos. Cores a que se acrescentou tez desmaiadas dos imigrantes do Leste europeu, os eslavos, os que deram o nome aos escravos no tempo dos Romanos.
Os estados ocidentais usam a independência entre os órgãos de soberania para distinguir casos de política, campo em que teoricamente todos os actores são iguais, e casos de polícia, onde todos sabemos quem são os bandidos e as boas pessoas, o que geralmente é confirmado pelos tribunais.
Claro que houve teóricos, como John Rawls, que desenharam regras para que os tribunais se tornassem justos, decentes (tradução livre da palavra original fair, em inglês). A experiência mostra que tais esforços não vingaram. Pode mesmo afirmar-se que as injustiças realizadas nos tribunais reforçam e aprofundam as injustiças socio-económicas, ao inverso dos desejos e espectativas daquele autor.
A inoperância dos poderes judiciais para tolher as ilegalidades cometidas por agentes policiais (como nas prisões, no SEF e também noutras polícias) é, ao mesmo tempo, a expressão, o reconhecimento e a exposição do poder hipócrita do estado. Os polícias, procuradores e advogados reservam para si o campo dos exercícios racistas que transformam, queiram ou não, por dever de ofício, os crimes em criminosos, suspeitas em condenações, males menores em males maiores, como a xenofobia em racismo. Os políticos e os tribunais reelaboram em teoria os costumes a que dão continuidade e suporte, nomeadamente mantendo abertas universidades e faculdades que ensinam a perpetuar o status quo. Aprendem a falar com uma ambiguidade que só os comentadores e outros especialistas que vivem dos canais por cabo entendem, falando para os iniciados e humilhando permanentemente os não iniciados por não terem aprendido a hipocrisia dominante: enquanto profissional, da política ou da polícia, cada um faz o que tem a fazer e aprende a explicar o que faz escondendo aquilo que sabe que não se deveria estar a fazer.
O racismo institucional sempre esteve connosco, mantido adormecido na protecção da impunidade. Por estes dias, o racismo aproveita o ambiente internacional, a impotência do politicamente correcto, as teorias desculpabilizantes do racismo institucional. Toma assento política e nos órgãos de comunicação social, o que entusiasmou pelo menos um chefe de polícia.
2 respostas
Mais um idiota útil.
Também tu BRUTUS?!!!
O também tu BRUTUS, destina-se à Worl presa.
Pensava eu que censura era coisa de fascistas, mas não ela está aí.
Há aí uns indivíduos que costumam gritar fascismo nunca mais!
Eu acrescento: nunca mais acaba!